quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

 Essa crônica da Martha Medeiros, do livro Trem Bala, se encaixou perfeitamente ao momento que estou aprendendo a viver e entender.



Por mais que o poder e o dinheiro tenham conquistado uma ótima posição no ranking das virtudes, o amor ainda lidera com folga. Tudo o que todos querem é amar. Encontrar alguém que faça bater forte o coração e que justifique loucuras. Que nos faça entrar em transe, cair de quatro, babar na gravata. Que nos faça revirar os olhos, rir á toa, cantarolar dentro de um ônibus lotado. Tem algum médico ai?!
Depois que acaba essa paixão retumbante, sobra o que?! O amor. Mas não o amor mitificado, que muitos julgam ter o poder de fazer levitar. O que sobra é o amor que todos conhecemos: o sentimento que temos por mãe, pai, filhos e amigos. É tudo o mesmo amor, só que entre amantes existe sexo. Não existem vários tipos de amor, assim como não existe três tipos de saudade, quatro de ódio, seis especies de inveja. O amor é unico, como qualquer sentimento, seja ele destinado a familiares, ao conjunge, ou a Deus. A diferença é que, como entre marido e mulheres não há laços de sangue, a sedução tem que ser ininterrupta. Por não haver nenhuma garantia de durabilidade, qualquer alteração no tom de voz nos fragiliza, e de cobrança em cobrança acabamos por sepultar uma relação que poderia ser eterna.
Casaram. Te amo pra lá, te amo pra cá. Lindo, mas insustentável.
O sucesso de um casamento exige mais do que declarações românticas  Entre duas pessoas que resolvem dividir o mesmo teto tem que haver muito mais que amor, e as vezes nem necessita um amor tão intenso.
É preciso que haja, antes de mais nada, respeito. Agressões zero. Disposição para ouvir argumento alheios. Alguma paciência. Amor, só, não basta.
Não pode haver competição. Nem comparações. Tem que ter jogo de cintura para acatar regras que não foram previamente combinadas.Tem que haver bom humor para enfrentar imprevistos, acessos de carência, infantilidades. Tem que saber relevar. Amar, só, é pouco.
Tem que haver inteligencia. Um cérebro programado para enfrentar tensões pré-menstruais, rejeições, demissões inesperadas, contas para pagar.Tem que ter disciplina para educar os filhos, dar exemplo, não do gritar. Tem que ter um bom psiquiatra. Não adianta, apenas, amar.
Entre casais que se unem visando a longevidade do matrimonio tem que haver um pouco de silêncio, amigos de infância, vida própria, independência  um tempo para cada um. Tem que haver confiança. Uma certa camaradagem: as vezes fingir que não viu, fazer de conta que não escutou. É preciso entender que união não significa, necessariamente, fusão. E que amar, solamente, não basta.
Entre homens e mulheres que acham que amor é só poesia tem que haver discernimento, pé no chão, racionalidade. Tem que saber que o amor pode ser bom, pode durar para sempre, mas que sozinho não da conta do recado.
O amor é grande, mas não é dois.
É preciso convocar uma turma de sentimentos para amparar esse amor que carrega o ônus da onipotencia.
O amor até pode nos bastar, mas ele próprio não se basta.


{Crônica "Não basta Amar"}

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